A influência de Bergson na recepção da psicanálise na filosofia francesa: a questão do inconsciente
Resumo
Este artigo elabora algumas considerações sobre o papel desempenhado pelo bergsonismo na recepção da teoria freudiana na França. Pretende-se determinar em que medida a filosofia de Bergson preparou o ambiente intelectual francês para a efetiva recepção da psicanálise, influindo no modo como Freud passou a ser lido nas fases posteriores da filosofia francesa: existencialismo e estruturalismo. Se, no momento espiritualista, houve de fato uma afinidade teórica entre a metafísica da virtualidade e a metapsicologia freudiana; na fase posterior haverá uma rejeição radical da hipótese do inconsciente, na filosofia de Sartre, por exemplo (rejeição já prenunciada por Georges Politzer). Semelhante recusa pode ser lida como uma reação à metafísica bergsoniana, à ideia de vida interior, o que irá desembocar, de certa maneira, na reabilitação do inconsciente, não mais pensado como uma região da interioridade, uma instância psíquica, mas, dessa vez, assimilado como linguagem, particularmente numa fase do pensamento de Jacques Lacan.
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